Nápoles, 13 de Dezembro de 1954
Meu caro Mário
De posse da tua carta de 9, que recebi no próprio dia do embarque em Frankfurt. Não sei se já te acusei a recepção das credenciais. Se não o fiz, foi por um imperdoável esquecimento, atenuado contudo pela imensidão de questões a tratar nos últimos dias. Esse assunto ficou bem resolvido, pois tudo se fez a tempo de ainda ir a Berlin e vir. O envelope que agora segue esteve pronto já há uns dias, simplesmente aguardava ainda uma carta tua, para responder ao que fosse necessário. Recebi também a lista completa dos presos de Angola. Ciente das démarches que estás fazendo quanto à Associação dos juristas. Comunicarei o que dizes pª o V.. Quanto à falta de dinheiro, é um problema difícil. Creio que em breve virá alguém de lá e talvez se possa estudar a questão. Esse alguém, o eng., até me pede para não partir tão cedo, para nos encontrarmos na Bélgica, simplesmente a carta chegou-me às mãos duas horas antes da partida, em que não havia a mínima possibilidade de adiar. telegrafo hoje ou amanhã a dizer que não posso passar o Natal com eles (o convite era feito nesses termos) e que escreverei. Vou dizer que de qualquer maneira será conveniente a saída deles, pois dadas as modificações que parece terem feito na estrutura do mac, é necessário discutir bem uma série de pontos. E vocês aí comunicariam por correio expresso com o V. a agenda a discutir e as conclusões a que chegassem, informando-me ao mesmo tempo do que se passasse. O ideal seria que o tipo que viesse pudesse contactar comigo e com o V., mas isso creio não ser fácil, nem economicamente, nem por questões de segurança, dado que o carimbo da DDR ou de Tunísia, são sempre aborrecidos de mostrar aos pides. Mas há uma coisa: os passaportes portugueses não precisam de visa pª a Tunísia e talvez o carimbo fosse fácil de evitar, desde que se levasse uma carta do embaixador da Tunísia, ou mesmo eu lá conseguisse que alguém fosse esperar o mensageiro. Não percebo de resto que o eng. arrisque tanto… e não se ponha a milhas, definitivamente.
A morada da moça é DEOLINDA RODRIGUES DE ALMEIDA; Instituto Metodista
C.P. 12681
Santo Amaro, S. P. Brasil
Os papéis que seguem aqui junto são o Projecto de Manifesto, com as respectivas correcções enviadas posteriormente, e uma apreciação feita por nós em fr. Não existe por enquanto o projecto de Regulamento, dado que esperamos saber o que se fez em 1ª nesse sentido.
Diz ao Marcel que recebi e agradeço a carta dele, bem como o «bilhete de recomendação» que espero utilizar.
Obrigado pelos teus votos. De facto bem precisamos de resolver a sério esta situação instável em que lutamos, e que não traz metade dos progressos que poderia trazer. Pelas notícias da sede, porém, sente-se que a malta está cada vez mais interessada, e que a luta tem dado frutos. Os jornais de Lisboa noticiam que o Secretário Geral das N. U. vai lá agora falar com o Presidente do Conselho. Mesmo que não seja expressamente por causa do telegrama, decerto o assunto será focado.
Convinha-nos estar a par do que se passa no julgamento. Vou enviar cópia do telegrama para a secção portuguesa da Rádio Brazzaville que parece estar dando notícias interessantes, segundo informações de Lisboa. Vamos também mandar para a Conferência dos povos Afro-asiát.. Pensamos ser de mandar agora um memorandum à N. U. que explique melhor o telegrama, enviando também cópias para a Conf. Afro-asiát. e outras organizações.
Neste momento não me ocorre mais nada. Um grande abraço para a Sarah e saudades para vós da Ruth. Abraça-te o
Lara
Carta de Lúcio Lara (Nápoles) a Mário de Andrade