Foi publicado no 2º volume de «Um amplo movimento…»
MOVIMENTO POPULAR DE LIBERTAÇÃO DE ANGOLA
MPLA
51, Avenida Tombeur de Tabora – C.P. 720
LÉOPOLDVILLE
CONFERÊNCIA DE IMPRENSA PROFERIDA PELO
DR. EDUARDO DOS SANTOS, MEMBRO DO COMITÉ DIRECTOR
Desde a instalação do nosso bureau principal em Léopoldville, é a segunda vez que o Comité Director do MPLA se dirige à opinião pública internacional. Sentimo-nos honrados com a presença dos senhores representantes da imprensa.
Há muito tempo que o Movimento Popular de Libertação de Angola faz démarches junto dos outros partidos nacionalistas angolanos tendo em vista a formação de uma Frente de Libertação de Angola.
A unidade de acção entre as diversas organizações nacionalistas de Angola combatente foi e continua a ser o problema fundamental da política interior do MPLA.
Na sua conferência de imprensa de 30 de Outubro de 1961, o Snr. Mário de Andrade, Presidente do MPLA afirmou:
“A cada etapa importante do desenvolvimento da nossa luta de libertação, lançamos apelos para a realização da unidade dos nossos movimentos. Sempre animados das mesmas preocupações, fomos um dos promotores da Conferência de Casablanca que reuniu em Abril último as organizações nacionalistas das colónias portuguesas de Angola, Cabo Verde, de Goa, da Guiné, de Moçambique e de S. Tomé e Príncipe”.
Defendendo a ideia da criação de uma Frente de todos os angolanos através das suas organizações, o MPLA enviou a Léopoldville, no mês de Abril de 1961, uma delegação devidamente credenciada pelo seu Comité Director. Nas reuniões efectuadas com os comités directores da UPA, da ALIAZO (actualmente PDA) e do Movimento para a Libertação do Enclave de Cabinda (MLEC), concluiu-se da necessidade da criação de uma Frente. Combinou-se mesmo a convocação de uma conferência onde se discutiria a estrutura e o programa dessa Frente. Tal conferência deveria realizar-se em Monróvia no mês de Maio de 1961.
Nas reuniões efectuadas em Léopoldville no mês de Abril os delegados do MPLA exprimiram os seus pontos de vista num projecto de estatuto e num programa da eventual Frente e que foram distribuídos às organizações mencionadas a pedido dos respectivos comités directores.
Eis uma parte do texto deste projecto de estatutos:
“Os objectivos da Frente são os seguintes:
– Conquistar, por todos os meios, a independência completa e imediata de Angola.
– Defender por todos os meios a soberania total e inalienável do povo angolano e o exercício da democracia na vida política do país.
ORGANIZAÇÕES DA FRENTE:
As organizações de base da Frente são os movimentos políticos, os sindicatos, as organizações de trabalhadores, dos jovens, das mulheres, dos estudantes e dos soldados.
O Comité Executivo da Frente é eleito pela Conferência Nacional da Frente, constituída pelos delegados credenciados pelo órgão supremo de cada partido político e de cada organização membro da Frente. Cada partido político e cada organização poderão enviar à Conferência Nacional três delegados...
“PROGRAMA COMUM”
O Programa Comum da Frente de Libertação de Angola compreende os dois pontos seguintes:
– Lutar, por todos os meios, pela liquidação do colonialismo português e por todos [sic] os vestígios das relações colonialistas em Angola.
– Conquistar, preservar e reforçar todas as condições indispensáveis à realização plena da autodeterminação do povo angolano: que este determine livremente o seu estatuto político e o seu sentido de desenvolvimento económico, social e cultural.”
Em Maio de 1961 o Comité Director da UPA informou o MPLA que o seu Presidente, Holden Roberto se encontrava em Monróvia, disposto a um contacto preliminar. Imediatamente, uma delegação conduzida pelo Presidente do MPLA se deslocou à capital da Libéria com o fim de encontrar-se com aquele. Holden pretextando desconhecer o conteúdo das conversações de Léopoldville, recusou-se a discutir os problemas relacionados com a formação da Frente.
Em Outubro de 1961, quando da instalação do seu bureau principal em Léopoldville, o MPLA recomeçou as suas démarches no sentido da criação de uma Frente, desta vez secundadas pelas da ALIAZO e da UNTA. O Presidente da UPA recusou-se categoricamente, e, num “comunicado” à imprensa publicado a 23 de Novembro, no jornal “Le Courrier d’Afrique” declarava que uma Frente apenas seria aceitável com a integração pura e simples dos outros movimentos políticos na União das Populações de Angola.
No seu regresso da Conferência de Belgrado, o Snr. Holden declarava à imprensa, em Léopoldville, que a Frente de Libertação de Angola não podia ser constituída, uma vez que a UPA era o único movimento político angolano que combatia militarmente o colonialismo português.
Entretanto, à media que os acontecimentos se desenrolavam no nosso país, a necessidade da criação de uma Frente de Libertação de Angola, capaz de conduzir activa e concretamente a luta do povo angolano pela sua independência e pela sua libertação, tornava-se mais premente.
A recusa sistemática do presidente da UPA à criação de uma Frente; a sua pretensão de afastar por todos os meios, os verdadeiros nacionalistas angolanos, quer dos campos de batalha – pelo assassinato – quer da cena política – pela calúnia, pela intriga, pela supressão física – demonstram-nos claramente que Holden Roberto pretende apresentar-se como o leader incontestado do Povo angolano.
Outros factos vieram afastar todas as dúvidas que porventura, pudessem ainda persistir a respeito de Holden Roberto.
Com efeito, o Comandante Kassanga e o Secretário-Geral da Liga dos Trabalhadores de Angola, o Snr. André Kassinda, nas suas Conferências de Imprensa e “Comunicados” do mês de Março, denunciaram à opinião pública internacional a personalidade moral e política de Holden Roberto e do seu colaborador mais directo, Rosário Neto.
O Presidente e o Vice-Presidente da União das Populações de Angola são acusados de terem cometido crimes graves contra o Povo de Angola.
– São acusados do massacre bárbaro do Comandante Ferreira e dos elementos da sua coluna militar que se dirigia para Nambuangongo em socorro das milícias do MPLA e do povo desta região em combate contra o exército português e numa situação de inferioridade de armamento.
– São acusados do massacre de oito mil nacionalistas angolanos.
– São acusados como os responsáveis pela morte do Comandante Batista.
– Holden Roberto e Rosário Neto inspiraram e incitaram os povos de certas regiões de Angola ao tribalismo, ao racismo, à luta fratricida.
– São acusados de desvio de fundos importantes, que eram destinados à luta do povo de Angola.
Em certos meios, verifica-se uma certa tendência de insinuar-se que as declarações feitas por aqueles dois nacionalistas foram inspiradas pelo MPLA.
As suas declarações não são mais do que o reflexo de uma profunda cisão existente no seio da UPA, entre os verdadeiros patriotas angolanos que militam nesta organização, servindo indiscutivelmente a causa do povo angolano e os oportunistas e os traidores que, explorando habilmente a boa-fé de alguns angolanos, se utilizam da justa luta do nosso povo contra o colonialismo português, para satisfação dos seus interesses pessoais – criminosos, segundo as declarações dos Senhores Kassanga e Kassinda.
O MPLA nada tem a ver com tais declarações. Entretanto, segue os acontecimentos, vigilante e atentamente, na defesa dos sagrados interesses do Povo de Angola.
A completa revelação da personalidade moral e política de Holden Roberto e do seu colaborador Rosário Neto bastou para fazer desaparecer em questão de dias todos os obstáculos que o Presidente da UPA tinha criado à constituição da Frente.
E, o que é mais surpreendente, acaba de ser constituída uma Frente, por própria iniciativa daquele, sem que o MPLA e outras organizações nacionalistas tenham sido, ao menos, consultadas!
Com efeito, no dia 29 de Março último, Holden Roberto, os seus amigos da UPA e um grupo de indivíduos do PDA anunciaram a constituição de uma Frente de Libertação de Angola.
É evidente que a dita Frente não foi criada com o propósito de combater o colonialismo português!
Holden Roberto pretende, por “golpes teatrais”, destruir as acusações que lhe foram feitas pelo Comandante Kassanga e pelo Senhor Kassinda; pretende continuar a enganar a opinião pública internacional; pretende ser considerado como o chefe incontestado da insurreição do povo angolano; pretende fazer um complot contra o MPLA e as outras forças nacionalistas que se têm mostrado firmes na defesa da causa do nacionalismo angolano.
O MOVIMENTO POPULAR DE LIBERTAÇÃO DE ANGOLA denuncia mais esta manobra de Holden Roberto, afirma a sua intenção de não dar a menor importância à criação desta pretensa Frente, e afirma a sua disposição de continuar inflexível no combate para que o Povo de Angola possa conquistar uma independência que o liberta totalmente da dominação colonial e possa dedicar-se, num clima de concórdia nacional, à obra de reconstrução do nosso país.
Léopoldville, 5 de Abril de 1962
O COMITÉ DIRECTOR
[carimbo do CD]
Declaração de Eduardo Santos em conferência de imprensa sobre o GRAE (Léopoldville)