Documento programático do MPLA

Cota
0042.000.021
Tipologia
Documento Programático
Impressão
Dactilografado
Suporte
Papel comum
Autor
MPLA - Movimento Popular de Libertação de Angola
Data
1962
Idioma
Conservação
Bom
Imagens
9
Observações

Foi publicado no 2º volume de «Um amplo movimento…»

 [Sem data] [Nota manuscrita por L. Lara: “Memorando / Programa 1962”] Os Povos, a humanidade em geral, começaram a viver uma era completamente nova. O que caracterizada essa era, não são apenas a utilização da energia atómica, o início do domínio do Cosmos pelo Homem e a nova estrutura predominantemente democrática e social dos Estados; mas é também a liquidação do sistema colonial mundial. Apesar das diferentes formas de reacção das potências coloniais à descolonização e apesar das diferentes modalidades e fases de descolonização por que passaram as ­­ex-colónias­ africanas, é um facto que a maioria dos países africanos goza hoje de ­soberania nacional e internacional. Partindo da mesma situação em que Portugal amarra as suas colónias – a ­situação de território integrado à força à “Metrópole” – o heróico povo argelino acaba de conquistar o seu direito à independência. A independência nacional é, pois, uma reivindicação profunda e irresistível dos povos africanos. Dentre as potências colonizadoras somente Portugal se agarra a posições cada vez mais atrasadas e odiosas do colonialismo, tendo ousado mesmo opor à resistência nacionalista dos povos das colónias a guerra colonial com práticas de sadismo bárbaro. Da posição irrealista e odiosa de Portugal resultou que a sua política colonial não só não encontra apoios abertos entre os Estados membros da ONU, mas é ainda criticada por esses Estados. A causa justa e a luta do Povo angolano impuseram-se já à simpatia e ao apoio esclarecidos de todos os povos do mundo; e o que é mais importante: conquistaram o apoio activo de todos os Estados independentes de África de não importa qual grupo. Portugal está cada vez mais isolado; e se ainda recebe alguns apoios, estes não ousam porém revelar-se abertamente. A atitude indisciplinada e de desprezo arrogante que Portugal adopta em relação à ONU, a solução que Portugal forçou a Índia a tomar para libertar Goa, Damão e Diu e o conhecimento geral de que o regime português é ferozmente oposto às liberdades democrática, – tudo isso já fez compreender à opinião internacional que o regime português só entende a linguagem da força. Daí a compreensão e o apoio internacionais de que goza a resistência armada do povo angolano. Até ao presente, a resistência armada teve o carácter de uma insurreição popular. A insurreição popular foi positiva. Esta transformou radicalmente o clima político em Angola, instalou a revolta no coração de cada angolano, prestigiou e popularizou métodos revolucionários de luta, abalou a administração portuguesa, enfraqueceu a economia colonialista e aprofundou o conflito entre todas as classes portuguesas e a política seguida pelo seu governo. Mas a insurreição popular teve e tem ainda fraquezas que devem ser vencidas. Essas fraquezas são: a falta de unidade de acção das organizações nacionalistas; a ausência de um programa de Front, autenticamente nacional, capaz de mobilizar, orientar e unir todas as energias da nação; a falta de um comando único para todos os “maquis”; a impressão exterior de que a resistência popular é desorganizada, localizada, descoordenada e sem objectivos políticos claros e comuns ao povo inteiro. Por conseguinte, à insurreição popular deve suceder imediatamente a resistência político-militar de carácter eminentemente nacional, unido e organizado. O maior obstáculo que a insurreição popular encontrou foi o facto de que ela eclodiu e se desenvolveu nas condições de regime fascista em Angola. Por essa razão, parte das energias nacionalistas teve de se refugiar no exterior e agir do exterior. Assim, a acção nacionalista ficou de certo modo dividida. A presença na direcção de algumas organizações nacionalistas, que agem do exterior, de elementos sem laços, ou com atenuados laços, com as realidades especificadas de Angola; a falta da pressão e do controle imediatos das massas populares angolanas sobre as organizações nacionalistas no exterior, as concessões necessárias ou forçadas perante a realidade e os poderes dos países onde essas organizações são obrigadas a agir, concessões que atentam de certo modo contra a pureza dos interesses e a personalidade do nacionalismo angolano; as imiscuições, as manobras e as intrigas de interesses não africanos no sentido de manter a divisão do nacionalismo angolano e de introduzir neste os germes da guerra-fria mundial; a existência de pessoas e de organizações angolanas que atentam contra a unidade de objectivo (a independência nacional de Angola), pregando o micro-nacionalismo, a desintegração territorial e o tribalismo; o exclusivismo arrogante; e a luta fratricida – tais são as deficiências e os problemas que subsistem no movimento libertador e nas diferentes organizações angolanas. Mais de um ano de insurreição popular colocaram o problema angolano sob a atenção constante e séria da opinião internacional. Cada acto e cada declaração do nacionalismo angolano têm, desde há algum tempo, uma grande ressonância internacional. Impunha-se, portanto, aproveitar essa receptividade internacional para demonstrar ao mundo a maturidade política do nacionalismo angolano. O espírito de responsabilidade, a seriedade, e a medida nas acções deveria informar o comportamento geral do nacionalismo angolano, e honrar, desse modo, o prestígio mundial de Angola. Porém, nem sempre assim sucedeu. A formação pela UPA e pelo PDA de um pretenso governo angolano no exílio tentou desprestigiar o nacionalismo angolano e afichar [sic] na face deste um acto de imaturidade e de consagração de divisões, acto que o nacionalismo angolano não pode deixar de rejeitar e de não subscrever. As restantes organizações angolanas enfermam (é certo que umas mais do que outras) do facto de a consciência e a acção dos seus dirigentes oscilarem entre as suas obrigações profissionais e de segunda cidadania, por um lado, e os seus deveres de defensores intransigentes dos interesses justos da causa angolana, do outro lado. A situação moral, o condicionalismo do meio estrangeiro, e a carência de meios adequados de acção impedem, evidentemente, que essas organizações esposem os métodos de acção que o povo é obrigado a utilizar no interior de Angola e que se solidarizem com a resistência armada do povo. É, pois, evidente de que, no essencial, não são as diferenças de métodos de acção proclamados hoje por cada uma das organizações angolanas que impedem a criação de um Front Nacional Unido, mas sim as causas atrás apontadas. Impõe-se, por conseguinte, ao MPLA desenvolver – sem ingenuidade, sem se deixar enganar – um paciente e infatigável trabalho de explicação e de apoio, junto de todos os dirigentes políticos angolanos honestos, no sentido de que eles se afirmem como construtores consequentes da unidade nacionalista. Todo esse trabalho deve ser feito em cumprimento da palavra de ordem: “A libertação de Angola deve ser obra de TODOS os angolanos e não apenas de uma fracção do povo, seja qual for a sua importância”. É incontestável que o MPLA é a organização política angolana que mais esforços tem feito para a formação de um número encorajante de quadros destinados, quer ao desenvolvimento da luta político-militar, quer à construção e ao desenvolvimento de um Estado moderno. O MPLA tem dado uma contribuição eficaz e importante aos aspectos político, militar, diplomático e social do nacionalismo angolano. O largo apoio e o prestígio que o MPLA goza, tanto no interior de Angola, como no plano internacional, são os prémios às suas acções e obras patrióticas. Todavia, deve-se reconhecer que a organização da actividade geral, a política de formação de quadros e a disciplina no cumprimento e na aplicação dos princípios do Movimento não obtiveram ainda o aperfeiçoamento, o nível, a energia e a firmeza que deveriam permitir um melhor aproveitamento das capacidades dos militantes e da acção e dos meios do Movimento, uma grande superioridade das realizações no interior de Angola sobre as realizações no exterior, uma primazia real dos problemas militares sobre outros também importantes, e uma disciplina revolucionária que impusesse aos militantes todo o respeito devido ao Movimento e o cumprimento rigoroso dos seus deveres materiais e políticos para com o MPLA. Por essas razões, a nova organização de actividade geral do Movimento deve procurar ultrapassar, no menor espaço de tempo, as deficiências atrás apontadas. O objectivo principal do combate do MPLA é a independência nacional. O meio para atingir esse objectivo é a Revolução nacionalista que destrua o regime colonial português. As armas não são os únicos instrumentos da Revolução. A enxada, o livro, a serra, o martelo, o comércio, a indústria, etc. têm igualmente tarefas insubstituíveis na Revolução. Todas as camadas sociais: camponeses, operários, intelectuais, comerciantes, artesãos e industriais – têm lugar dentro da Revolução. A Revolução é nacional e não de classes. O MPLA não pretende impor um regime em Angola. O MPLA luta pela soberania indivisível do POVO. Somente ao POVO angolano competirá escolher livremente o regime político, económico e social em que quererá viver. A condição essencial para que o POVO se afirme como um único soberano em Angola e para que ele escolha, com liberdade efectiva, o seu regime, é a independência nacional. O MPLA tem porém o direito de defender que um regime adequado às bem conhecidas aspirações do povo se inscreva e se desenvolva no quadro geral da República, da democracia e da justiça social. Uma das características da nova era é a unidade do mundo, a interdependência crescente dos povos. Na nova era, independência não significa isolamento, política irresponsável perante o Mundo e imune da sanção da opinião e do direito internacionais. Por esta razão, o MPLA tem o direito de defender que o futuro Estado livre e independente de Angola subscreva e cumpra os princípios da Carta das Nações Unidas e da Declaração Universal dos Direitos do Homem. A mais sólida garantia da estabilidade do futuro Estado livre e independente de Angola será a incarnação pelo Povo do espírito democrático. Este espírito só pode ser adquirido pela prática efectiva pelo Povo das liberdades democráticas. Somente pela verificação por experiência própria das vantagens e benefícios da democracia, poderá o POVO transformar-se no guardião vigilante da disciplina democrática, fazendo respeitar os princípios da obediência das minorias às maiorias e da colaboração em todos os níveis entre o Povo e o governo, e tendo a possibilidade de verter um conteúdo original – angolano, africano – na democracia nacional. O MPLA defende os direitos da pessoa e as liberdades de expressão, de consciência, de reunião, de associação, de organização, de crença, etc.; e sustenta que o futuro Estado livre e independente de Angola deverá estabelecer, constitucionalmente, garantias reais da inviolabilidade dos direitos e das liberdades do cidadão. Tudo em defendendo [sic] o direito à propriedade privada, o MPLA, no quadro dos imperativos da justiça social, defende igualmente o direito de cada angolano ser assegurado de uma vida decente pelo seu trabalho e o direito de os membros fracos e pobres da sociedade serem garantidos de uma protecção diante dos membros mais fortes e poderosos. O exercício da democracia e o respeito da propriedade privada não são incompatíveis com as seguintes medidas exigidas pelo Povo e que o MPLA defende: Terra para os camponeses sem terra; política de salários justos que possibilitem uma vida decente aos trabalhadores; política de crédito ao alcance dos camponeses, dos comerciantes e dos industriais cuja actividade beneficie efectivamente a economia do país e ajude a elevar o nível de vida da população, modernização dos meios de trabalho e das condições de existência, e elevação do nível de vida, da cultura, das condições sanitárias das grandes populações rurais – o que, por sua vez, ajudará a criar um mercado interno seguro, ­estimulando desse modo o desenvolvimento do comércio e da indústria nacionais; instituições modernas de cultura, de ciência, de técnica, de arte e de desportos à disposição da juventude angolana, sem discriminação de fortuna, de origens, de raça e de sexo; igualdade entre a MULHER e o HOMEM perante a lei, a família e o trabalho. É incontestável que Angola, para vencer eficaz e rapidamente, o seu subdesenvolvimento, necessitará da ajuda técnica e financeira estrangeira. O MPLA defende, no entanto, o princípio de que essa ajuda deverá basear-se na igualdade entre os Estados, no respeito mútuo da soberania, e na exclusão de qualquer condição política ou militar. Uma política nacionalista de investimentos estrangeiros em Angola deverá manter, a todo o custo, nas justas proporções, a relação entre os interesses nacionais e os interesses estrangeiros. O Estado angolano deverá opor-se resolutamente a que a ajuda financeira estrangeira se transforme numa fonte de corrupção pública, enriqueça ilegitimamente uma casta nacional, contribua para contrapor o Povo à administração, e levante qualquer espécie de obstáculo aos esforços do Estado para substituir a economia colonial por uma economia equilibrada para desenvolver o seu sector económico, para realizar uma política de investimentos planificados, para planificar a economia nacional e para controlar esta, bem como ao desenvolvimento preferencial do comércio e da indústria privados e nacionais. O MPLA defende para Angola a doutrina do neutralismo positivo, do não engajamento a blocos, e de uma política estrangeira independente e pacífica. A Revolução angolana oferecerá, por conseguinte, aos angolanos de ambos os sexos, de todas as etnias e de todas as camadas sociais, possibilidades reais de uma existência de liberdade, de progresso, de prosperidade, de paz e de felicidade. Eis porque é do interesse dos angolanos de ambos os sexos, de todas as etnias e de todas as camadas sociais apoiarem, com todas as suas possibilidades e energias, a REVOLUÇÃO angolana. Angola será, infalivelmente, livre e independente. O problema é saber quando, como e ao preço de que sacrifícios. Os duros anos precedentes de luta já convenceram a todo o angolano que a ­liberdade e a independência não são uma dádiva, mas o fruto de uma luta concreta, nacional, áspera e longa. A libertação e a independência de Angola poderão resultar da vitória militar sobre o inimigo, de um cessar-de-fogo [sic] baseado em garantias, ou de um armistício com vista a negociações. Todos os objectivos da Revolução angolana são pacíficos. Por esta razão, teria sido lógico e preferível que as reivindicações do POVO angolano fossem satisfeitas pela via da negociação. É porém sabido que, até ao presente, Portugal se opôs brutalmente à negociação. A dominação portuguesa em Angola, que se caracterizou sempre pelo arbitrário, pela violência e pela supressão das liberdades fundamentais, culminou pela actual guerra colonial, bárbara e cruel. Detendo Portugal em suas mãos o poder político, militar, económico e cultural de Angola, a ele, e só a ele, competia ter escolhido sensatamente os processos e as etapas da descolonização pacífica de Angola. Portugal preferiu, porém, a via armada. Toda a responsabilidade da guerra em Angola recai unicamente sobre Portugal. É evidente que para o POVO angolano, a guerra de libertação cumprirá a sua missão desde o momento em que ela tenha levado o inimigo a reconhecer, sem reservas, o principal objectivo pacífico do POVO angolano: o direito garantido de Angola à independência. É possível, no entanto, que Portugal, ao convencer-se da impossibilidade de uma vitória militar, procure uma solução política para o problema angolano. Sejam quais forem porém as circunstâncias em que surgir a possibilidade da solução política, o MPLA sustenta, firmemente, que uma eventual negociação deverá basear-se nas seguintes condições mínimas: 1º– Reconhecimento do direito de Angola à autodeterminação e à independência. Soberania nacional e internacional de Angola (inclusive nos domínios da diplomacia e da defesa). 2º– Retirada de todas as forças armadas portuguesas para as suas bases de origem. 3º– Respeito da unidade do POVO angolano e da integridade territorial de Angola. 4º– Libertação incondicional de todos os prisioneiros políticos e liberdade de regresso a Angola de todos os refugiados e exilados políticos. 5º– Garantias para o exercício dos direitos democráticos; actividade livre e imediata dos partidos políticos, sindicatos e restantes organizações democráticas angolanas. 6º– Fixação de prazo e de garantias para a eleição de um Parlamento nacional, na base do direito do voto igualitário, directo e secreto para todos os cidadãos a partir dos 21 anos de idade, sem discriminação de raça, de sexo, de grau de instrução, de fortuna e de religião. 7º– Eleição, nas condições indicadas, de órgãos de governo em todas as cidades, vilas e aldeias. 8º– Fixação da data da ascensão de Angola à independência. O gesto da negociação deverá ser feito por Portugal. Antes porém de um eventual gesto conciliador por parte de Portugal, o POVO angolano e o MPLA deverão prosseguir sem ilusões e incessantemente, a luta armada. A Revolução angolana visa a destruir o regime colonial e não a atacar as pessoas e os bens dos portugueses e dos restantes estrangeiros que habitam Angola. Este princípio não é porém rígido, mas condicionado. A Revolução angolana só poderá garantir o respeito à vida e aos bens dos portugueses e restantes estrangeiros, se estes não colaborarem com a reacção colonial e apoiarem a Revolução. Antes e depois da independência, cada estrangeiro, será julgado de acordo com o grau das suas responsabilidades pessoais nas hostilidades ou de acordo com o grau do seu apoio à luta libertadora. O MPLA lança um apelo permanente às organizações nacionalistas angolanas para que concretizem urgentemente o anseio do POVO à “entente”, à colaboração e à unidade de acção das organizações nacionalistas por meio de um Front Nacional Unido. Impõe-se ao MPLA a adopção de novas medidas políticas e a execução perfeita e reforçada das medidas em vigor: execução rigorosa do princípio da direcção colectiva; formação de órgãos dirigentes com homens honestos, capazes, fiéis ao Movimento e ao POVO, incorruptíveis e corajosos; trabalho político directo, extenso, perseverante e profundo junto das massas angolanas; trabalho incessante de propaganda, informação e agitação directas junto das massas; organizações sólidas do povo, nas cidades, nas vilas, nas aldeias, nas florestas e nas montanhas; criar e desenvolver, obrigatoriamente nas regiões libertas, uma organização político-administrativo do POVO, com os seus serviços económicos e financeiros, sanitários, educativos, judiciários, de assistência social, e de segurança pública; criar, em todas as povoações, assembleias populares e comités de libertação, que actuarão como órgãos locais de governo e de gestão pública; “supressão” dos traidores e repressão dos malfeitores e ladrões; aumento contínuo dos fundos necessários ao desenvolvimento da luta político-militar; criação de escolas de quadros; desenvolver a capacidade de trabalhar, sem espírito sectário ou exclusivista, com todos os nacionalistas honestos, a fim de associá-los à luta comum. O MPLA deve acelerar a realização do princípio da primazia do interior sobre o exterior, aplicando rigorosamente as seguintes regras: a) Dever absoluto de ir ao encontro dos interesses da luta que se trava no interior do país, e de atendê-los imediata e satisfatoriamente; b) Preponderância permanente da actividade militar e política do interior do país sobre as restantes actividades do Movimento; c) Agir sistematicamente no sentido de que nos órgãos do Movimento, em todos os escalões, haja preponderância numérica de militantes no interior sobre os militantes no exterior. O MPLA deverá dedicar uma atenção especial, e um trabalho paciente e ­perseverante à juventude e à Mulher angolanas. A juventude angolana do interior do país já se afirmou, e seguramente afirmar-se-á mais no futuro, como o nervo e o músculo da Revolução. A sua paixão patriótica, a pureza da sua generosidade e a sua temeridade já provaram suficientemente que nenhuma força poderá parar a actividade política clandestina e a resistência armada em Angola. Até ao presente, a juventude angolana no estrangeiro sofre das limitações normais de uma actividade nacionalista mais teórica do que prática e tem sido vítima da contradição entre, por um lado, os seus deveres de puro patriotismo e, por outro lado, da falta de controle directo da família e da sociedade, das investidas das forças da corrupção e da divisão, e do radicalismo das suas próprias conclusões elaboradas a partir da sua experiência limitada – e não raro superficial e longínqua – de Angola. A actual divisão da juventude angolana no estrangeiro, se persistir, poderá de certo modo enfraquecer a unidade moral do movimento nacional de libertação, e porá ­certamente sérios problemas à unidade construtiva na Angola de amanhã. A perfeita tomada de consciência pela juventude das suas totais responsabilidades começará a partir do momento em que ela se unir com a convicção de que a sua divisão significa, de facto, a divisão das energias vitais da Nação. Todavia, deve-se reconhecer que a maturidade precoce da juventude angolana e o seu espírito aberto às inovações, propenso ao progresso e sequioso de uma cultura científica moderna e de uma moral elevada e à altura do universal, não têm sido ­suficientemente apoiados e alimentados, mesmo pelo MPLA. É incontestável que o futuro da Angola livre e independente dependerá da dedicação esclarecida, do patriotismo vigilante e da capacidade construtiva da juventude angolana. O MPLA deverá fazer todos os esforços para que a contribuição da juventude angolana à Revolução seja o mais eficaz possível. Para isso, o MPLA deverá continuar a criar e a obter as mais largas possibilidades para que a juventude adquira uma cultura científica e artística, moderna e sólida; uma moral patriótica e humanista; um espírito são, construtivo e unitário; e o hábito de uma actividade inspirada no verdadeiro e no belo. A Mulher e a infância foram, sem dúvida, as vítimas mais discriminadas e ­impotentes do regime colonial. A unidade combativa dos angolanos de ambos os sexos é um imperativo ­categórico. No entanto a contribuição da Mulher à luta será maior, se a ela se der o que ela pede: que se lhe liberte do preconceito e que se lhe invista dos mesmos direitos e deveres do Homem perante os destinos da Nação. A libertação da Mulher e a posse, por ela, de todas as oportunidades para a sua realização como cidadã plenamente responsável significará, em particular, a garantia, em Angola, de uma fonte de inspiração, poderosa e permanente, de grandes obras. Em consequência, a natureza e a situação específicas da juventude e da população feminina de Angola exigem que o MPLA se interesse pela organização daquela e desta e trate de todos os seus problemas no quadro rigoroso da unidade. O MPLA sustenta que o problema dos graus de centralização ou de ­descentralização do futuro Estado livre e independente de Angola é um problema demasiado sério – pelas suas implicações directas na unidade nacional, no desenvolvimento das populações e no progresso geral do país – para ser tratado a priori. Um tal problema só será validamente resolvido a partir, entre outros dados, da vontade das populações, expressa plausivelmente, e a partir de uma definição nacional da exploração coerente e eficaz dos recursos naturais, dos interesses reais de uma eventual planificação económica da nação inteira, e das conclusões de um debate concreto e responsável sobre as vantagens e as desvantagens de um legislativo e de um executivo centrais com autoridade para tomar decisões de interesse geral a longo termo. Nas condições actuais, nenhum partido pode, efectivamente, pronunciar-se com conhecimento de causa sobre tal problema. Em consequência, o MPLA sustenta que tal problema só poderá ser tratado concretamente, e com suficiência e autoridade, a partir de uma Assembleia constituinte, saída de eleições gerais e livres.

Documento programático do MPLA que tem o título manuscrito «Memorando - Programa 1962»

A publicação, total ou parcial, deste documento exige prévia autorização da entidade detentora.