Foi publicado no 3º volume de «Um amplo movimento…»
DE: GENTIL FERREIRA VIANA
MILITANTE DO MPLA
PARA: COMITÉ DIRECTOR DO MPLA
BRAZZAVILLE
AOS CAMARADAS MEMBROS DO CD
SAÚDE!
Eu, Gentil Ferreira Viana, militante do Movimento Popular de Libertação de Angola e titular do cartão de membro nº 20032 do MPLA, passado em Conakry no ano de 1961,
1 – Constatando que o MPLA falhou em termos globais e parcelares, na criação das condições de disciplina, camaradagem e entusiasmo revolucionário que garantissem a realização duma actividade esforçada capaz de reforçar a coesão interna da Organização e assegurar a vitória na luta de libertação nacional,
2 – Constatando que o MPLA falhou em termos globais, na formação de militantes (quadros técnicos e políticos) à altura de responderem com êxito, às exigências normais da luta de libertação nacional,
3 – Constatando que o MPLA falhou em termos globais e parcelares, na sua instalação como Organização Política, no interior do País, ficando por isso impossibilitado de enquadrar as massas angolanas e de impor, ao colonialismo português, a guerra popular para a independência completa da Pátria,
4 – Constatando que o MPLA falhou em termos globais e parcelares na busca do indispensável apoio internacional à luta de libertação nacional, desprestigiando-se aos olhos da África e do mundo e ridicularizando-se frente a um Portugal fascista e retrógrado e
1 – considerando com muita inquietação, que a obstinação em seguir-se com a velha estratégia e táctica do MPLA condena irremediavelmente a Organização a recorrer, mais tarde ou mais cedo, a soluções ditadas pelo desespero, as quais podem contrariar directamente a realização dos objectivos progressistas que constituem o ideal superior da nossa luta de independência e liberdade e
5 – Constatando com pena, que é inútil persistir (eu, Gentil Ferreira Viana) nas fileiras do MPLA – para mim, persistir é lutar. Para mim, lutar é combater com entusiasmo tendo, além do amor dos ideais e dos homens por quem e ao lado de quem se luta, a fé consciente na estratégia e na táctica que colectivamente se estuda e aplica... – já que a minha campanha pela adopção duma estratégia progressista de luta armada com os líderes máximos em armas, no interior do País, vem esbarrando sistematicamente contra a obstinação... das três Direcções do MPLA, desde meados do ano de 1961!! e
1 – atendendo por outro lado, à necessidade ditada pela situação crítica em que mergulhou o élan progressista angolano, de não generalizar à massa dos militantes e dos quadros do MPLA, a base da minha discordância principal com a estratégia e a táctica adoptadas pela nossa Organização, nos últimos três anos – generalização que inevitavelmente terá de dar-se, no caso de persistência da minha parte em querer guardar a qualidade de militante do MPLA,
decido apresentar desde agora, o pedido formal do meu afastamento completo e definitivo de membro do Movimento Popular de Libertação de Angola.
Não abandono nem abandonarei sem mais, a luta pela libertação incondicional do meu País! isso aliás pode ver-se e provar-se pela simples apreciação das teses que defendo desde há anos, e que oportunamente propus à crítica de cada uma das três Direcções políticas do MPLA. Hoje, tais teses estão todas recolhidas num relatório de trinta páginas dactilografadas que remeti há algum tempo, à apreciação do actual Comité Director e de alguns militantes, dos mais velhos e responsáveis dentro da Organização.
À luta justa do Povo do meu País, eu estou ligado por laços indestrutíveis da cabeça e do coração! Por Ela me ligo também às justas lutas dos Povos e dos Homens do meu continente e do mundo.
Em todas as circunstâncias, hei-de bater-me sempre com o mesmo entusiasmo e vigor com que lutei a campanha que acabo de perder!
Eu espero que os camaradas, membros do Comité Director do MPLA decidam sobre o meu pedido com a urgência que o mesmo necessariamente requer.
Brazzaville, aos vinte três de Dezembro de 1963
[assinado: Gentil Ferreira Viana]
Carta de Gentil Viana (Brazzaville) ao Comité Director do MPLA