Carta do BP do MPLA a Joe Nordmann

Cota
0059.000.017
Tipologia
Correspondência
Impressão
Dactilografado (2ª via)
Suporte
Papel comum
Remetente
Lúcio Lara - Gabinete Político do MPLA
Destinatário
Joe Nordmann
Data
Idioma
Conservação
Bom
Imagens
3
Observações

Foi publicado no 3º volume de «Um amplo movimento…»

 Brazzaville, 6 de Fevereiro de 1964 Ao Dr. JOE NORDMANN Advogado no Tribunal Supremo 19, Quai de Bourbon PARIS IV BUREAU POLÍTICO Ref. nº 4/BP/1964 Caro Amigo Não sabemos se as suas ocupações lhe permitiram acompanhar as diferentes fases da questão angolana, depois da Conferência de Addis-Abeba, que levaram ao reconhecimento do pretenso “governo angolano no exílio” (“grae”). De facto, aquando da Conferência de Addis-Abeba (Maio 1963), o MPLA saiu vitorioso sobre as teses do Sr. Adoula que queria convencer os Chefes de Estado africanos que só a UPA (ou a FNLA) de Holden Roberto representava a luta do Povo angolano. Tendo o MPLA, demonstrado que a sua participação na luta tornava arbitrária a pretensão do Sr. Adoula, os Chefes de Estado reconheceram que a nossa argumentação tinha fundamento. Na sua resolução sobre a DESCOLONIZAÇÃO, a Conferência Cimeira “§ 10 - CONVIDA INSISTENTEMENTE todos os movimentos nacionalistas de libertação a coordenarem os seus esforços, criando frentes comuns de acção onde quer que seja necessário, a fim de reforçar a eficácia da sua luta e a utilização racional da assistência concertada que lhes será concedida; § 11 - DECIDE criar um Comité de Coordenação composto pela Argélia, o Congo (Léopoldville), a Etiópia, a Guiné, a Nigéria, o Uganda, a República Árabe Unida, o Senegal e o Tanganica, cuja sede será em Dar-es-Salam (Tanganica) e que será encarregue de harmonizar a assistência fornecida pelos Estados africanos, assim como de gerir o Fundo especial instituído para esse fim; § 14 - DECIDE acolher, nos respectivos territórios dos Estados independentes de África, os nacionalistas dos movimentos de libertação para assegurar a sua formação em todos os domínios e conceder aos jovens toda a assistência necessária para a sua instrução e a sua formação profissional. § 15 - DECIDE favorecer, em cada Estado, a passagem de ajuda material e a criação de um corpo de voluntários em diferentes domínios, a fim de fornecer aos movimentos africanos de libertação nacional a assistência de que eles necessitam nos diferentes sectores.” Todas as tentativas feitas pelo MPLA para receber do Governo congolês (Léo) uma autorização para o trânsito de armas, não tiveram seguimento, apesar das inúmeras promessas que só tinham como objectivo o adiamento eterno de uma solução. O Governo Adoula mostrou mais tarde a sua má fé quando declarava que o MPLA não tinha actividade militar, o que longe de corresponder à realidade, nunca deveria ser afirmado por pessoas que tudo fizeram para impedir o reabastecimento em armas aos nossos grupos de guerrilha. A 29 de Junho de 1963, para responder ao golpe sofrido em Addis-Abeba no que diz respeito ao problema angolano, o Sr. Adoula e os seus inspiradores, em flagrante contradição com o § 10 da Resolução sobre a Descolonização, decidiram o reconhecimento unilateral de um pretenso “governo” que o Sr. Holden tinha proclamado sem sucesso em Abril de 1962. Foi um golpe de teatro desencadeado no mesmo momento em que o Comité de Coordenação da Ajuda reunia pela primeira vez em Dar-es-Salam com os representantes dos movimentos de libertação, a fim de estudar as modalidades de atribuição da ajuda de que trata o § 11 da Resolução acima mencionada. Os próprios delegados ao Comité dos Nove ficaram surpresos e o MPLA pôde requerer que uma Missão de Bons Ofícios se deslocasse a Léopoldville para tentar remediar as graves consequências desta decisão unilateral. O próprio Presidente Ben Bella declarava ao correspondente da O.C.O.R.A.1, à propósito desse reconhecimento: “Tudo depende do sentido que se dá a esse reconhecimento. Se se quer assim orientar a ajuda a favor dos movimentos de libertação de Angola, com proveito único para esse governo, é perigoso. Essa tomada de posição arrisca-se a comprometer a unidade dos movimentos de solidariedade prescrita pela Carta de Addis-Abeba. Se tal fosse a intenção do governo do Sr. Adoula, iria mesmo contra o espírito de Addis-Abeba. No entanto, se for apenas um reconhecimento que não decida sobre a ajuda que deverá ser concedida, ele apenas irá encorajar os irmãos angolanos.” (Cf. “Jeune Afrique” Nº 143 - 15/21 de Julho de 1963, pg. 7) No entanto, esta Missão dita de Bons Ofícios, quando chegou a Léopoldville, deparou-se com o Sr. Adoula numa posição intransigente e alguns desses membros devem ter sofrido fortes pressões por parte da Embaixada Americana (que não faltou a nenhuma sessão pública da dita Missão). Então todos os pretextos foram válidos para afastar o MPLA, para seguir a via que o Sr. Adoula e os seus inspiradores indicavam. O Senhor poderá encontrar aqui em anexo, os documentos relacionados com esta questão, nomeadamente a acta das sessões da Missão de Bons Ofícios, o Memorando apresentado em Dakar, a Nota enviada ao Comité de Coordenação, assim como dois outros Memorandos, um sobre a formação do pretenso governo (1962) e outro sobre o presumível reconhecimento pelo Governo Adoula (uma semana antes deste reconhecimento). Se tiver tempo disponível, agradecíamos-lhe que nos esboçasse um recurso da decisão “recomendando o reconhecimento” e nos enviasse por correio Expresso para poder ser apresentado na Conferência que se realizará a 24 do corrente. Pedimos desculpa pelo atraso com que fazemos este pedido. Queira aceitar, Caro Amigo, a expressão da nossa gratidão. Em nome do Bureau Político do MPLA L. LARA

Carta do Bureau Político do MPLA (ref: 4/BP/1964), assinada por Lúcio Lara (Brazzaville), a Joe Nordmann (advogado em Paris)

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