Discurso de Agostinho Neto

Cota
0104.000.010
Tipologia
Discurso
Impressão
Dactilografado
Suporte
Papel Comum
Autor
Agostinho Neto
Data
Idioma
Conservação
Bom
Imagens
10
6.6.68 - Alocução na Rádio Tanzânia no programa “Angola Combatente” Companheiros de luta! Camaradas! É com a maior alegria que aproveito esta oportunidade oferecida pelos Serviços exteriores da “Rádio Tanzânia” para vos enviar esta mensagem; mensagem que é destinada não somente aos compatriotas angolanos e aos camaradas do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), mas também aos bravos companheiros de luta que em moçambique, sob a bandeira da FRELIMO, erguem bem alto o facho da revolta contra a ocupação colonial portuguesa. Unidos no mesmo combate, os povos das colónias portuguesas, na Guiné Bissau, em Moçambique e em Angola, têm infligido, especialmente nos últimos tempos, inúmeras derrotas ao inimigo. As áreas controladas pelos guerrilheiros não cessam de aumentar. A vida nova nessas zonas vai-se aperfeiçoando e vão-se encontrando os caminhos que restituirão aos nossos povos a independência perdida há séculos atrás, a sua dignidade e o seu justo lugar no mundo. Por isso é que os movimentos que dirigem a luta nesses países ainda dominados por Portugal estão unidos e cooperam estreitamente, para conseguir objectivos comuns, ambos respeitando as diferenças existentes, nas condições específicas de cada país. E o que é certo é que, de uma maneira geral, a nossa luta pela independência não cessa de melhorar e de progredir. A cooperação das actuais colónias portuguesas, nesta fase e também no futuro, tanto para a conquista da independência como para a fase de reconstrução nacional, é e será absolutamente necessária. Felizmente temos já uma experiência em África, após a independência dos países do nosso Continente que eram dominados pelo imperialismo, e se, por um lado, esta experiência tem revelado muitos aspectos positivos, é evidente que, por outro lado tem revelado fraquezas, umas das principais sendo a quasi geral dependência económica em relação às antigas metrópoles, o que não permite, portanto, o acesso a uma independência completa. Esta experiência deve animar-nos, a nós que nos estamos batendo com as armas na mão, a encarar formas mais elevadas de organização e meios mais eficazes para atingir o nosso fim: a Independência completa. O sangue que estão derramando os melhores dos filhos das nossas pátrias, o esforço de cada guerrilheiro e de cada homem dos nosso povos, não pode nem deve ser mal gasto em formas pouco apropriadas de organização no presente e deficientes para a administração futura. É necessário que o controlo real do país, que do ponto de vista político como económico e social, esteja completamente nas mãos dos povos que se empenham na luta, e não nas de um punhado de burocratas e - diga-se de passagem - desonestos, nem sempre daqueles que se encontraram hoje no campo de batalha. Muito menos devemos permitir que os estrangeiros continuem a explorar os nossos povos, que o imperialismo estenda as suas unhas até aos nossos países para os subjulgar no neocolonialismo. Temos de nos bater por uma independência completa. E não há dúvida que para obter uma independência completa, política, económica e social, para que os nossos povos sejam realmente os senhores dos seus destinos é necessário que nos munamos de instrumentos apropriados para a acção. Na presente fase é necessário que a luta esteja completamente sob a direcção de um partido independente e com ideias bem definidos, que os seus militantes sejam disciplinados e assimilem inteiramente a doutrina do seu partido. É preciso que os dirigentes sejam honestos, modestos, activos e não poupem os seus esforços para bem orientar a sua organização e o seu povo. É preciso que eles estejam sempre ao lado do seu povo, acompanhando-o nos sofrimentos e nos sacrifícios diários. Um dos problemas que tem sido mais debatidos nos últimos tempos é o da presença no nosso território de portugueses ou de descendentes de portugueses, cujas ideias coincidem com os nossos, cuja vida também tem sido dedicada ao combate contra o fascismo em Portugal, que compreendem e aceitam o direito dos povos das colónias portuguesas se tornaram independentes e de se governarem como qualquer outro povo soberano. Neste capítulo temo observado por vezes reacções negativas por parte de alguns dos nossos combatentes e dos nossos amigos. E essas atitudes negativas não podem senão prejudicar a nossa luta de libertação. Eu falo do problema racial. Nos nossos países nós não estamos fazendo uma guerra racial. O nosso objectivo não é combater o homem branco só porque ele é buraco. É sim o de eliminar e combater aqueles que apoiam o regime colonial. Todos aqueles que se apresentam nos nossos territórios de mãos erguidas, desarmados ou desejando dar a sua colaboração aos guerrilheiros, fornecendo-lhes alimentação ou géneros que faltam nas matas; todos aqueles que de qualquer modo mostram o seu desejo de não cooperar com o regime colonial, não devem ser desprezados ou tratados como inimigos. Eles constituem uma força que joga a nosso favor do mesmo modo que, no plano internacional, nós não procuramos apenas o apoio dos países de África a Sul do Sahara, a chamada África Negra, onde a pele dos seus habitantes é mais escura, mas vamos também buscar esse auxílio aos países norte-africanos onde os povos que os habitam têm pele clara. Vamos mais longe, à Europa buscar a ajuda política, diplomática e material, aos países onde a maioria das populações tem a cor branca e a outros continentes onde diferenças raciais são mais que evidentes. Se nós desprezamos esta força formidável que é representada pelos progressistas de todo o mundo e pelos países subdesenvolvidos, à base das diferenças raciais, apenas estaremos cavando a nossa própria sepultura. A nossa luta não é uma luta isolada no mundo, faz parte de uma luta global da Humanidade para acabar com a exploração do Homem pelo Homem. Assim a devemos compreender, assim a devemos enquadrar no nosso espírito, saindo portanto dos limites estreitos dos preconceitos raciais. Por isso mesmo nós convidamos os portugueses, filhos do Povo português, que se encontram fardados e armados em Angola, em Moçambique e na Guiné, para que desertem das fileiras do exército colonial, que não sujem suas mãos no sangue de inocentes homens, mulheres e crianças, cujo o único objectivo é o de serem livres, que procedem da mesma maneira que os heróis portugueses durante a ocupação árabe e espanhola. Que não assassinem as populações indefesas e perante os guerrilheiros do MPLA, da FRELIMO e do PAIGC levantem os seus braços, que se entreguem e serão recebidos como homens e a eles será dado o destino que quiserem, dentro dos países que aceitem a presença de refugiados políticos. Ou, melhor ainda: nós fazemos um apelo aos soldados portugueses para que desertem com as suas armas e venham para o lado dos nacionalistas, evitando assim a vergonha de participarem numa guerra injusta e tão sua como é a guerra do Vietnam. No decurso da luta em Angola, o MPLA recebeu nos países limítrofes alguns portugueses que desertaram e que estão agora em vários países, alguns engajados activamente na luta contra o regime de Salazar e outros, utilizando pacificamente o seu trabalho para viver e fazer viver as suas famílias. Portanto, se persiste ainda em alguns dos nossos combatentes a ideia da luta contra o branco, é preciso que esta ideia seja imediatamente substituída pela luta contra o colonialismo e o imperialismo, da luta contra a opressão, pela liberdade e pela dignidade de todos os homens do mundo. Este ideal reforçará a nossa luta. Trazer-lhe-á mais garantias e novas perspectivas, que se abrirão num futuro radioso para todos os homens. Em vez de ódios, teremos a fraternidade e a compreensão. Isto não significa, camaradas e companheiros de luta, que devemos ser fracos, que não devemos aplicar golpes duros e o mais corajosos possíveis contra os racistas que desejam dominar os povos africanos; que devemos ser complacentes com os colonialistas, com os que no passado foram, ou ainda o são, carrascos do nosso Povo; que devemos ser complacentes com os agentes da PIDE ou com os colonos organizados em milícias. De forma alguma. Só uma justiça é possível. Só uma lei de guerra pode ser adoptada. Eles têm de ser liquidados, pois são o baluarte da exploração colonial. Não devemos confundir os amigos com os inimigos, mas tenhamos o cuidado de seleccionar, de escolher, de distinguir quem são os nossos amigos e quem são os nossos inimigos. Por vezes são os próprios inimigos que nos afastam dos amigos, aproveitando-se da nossa ingenuidade política ou das nossas fraquezas, uma das quais poderá ser o nosso preconceito racial. Lá onde não existe uma ideia clara sobre este assunto, o inimigo imperialista pode perfeitamente separar-nos dos nossos amigos e mesmo liquidar, pelas nossas próprias mãos, forças apreciáveis das nossas fileiras. Houve uma altura, entre 1961 e 1963, quando as forças reaccionárias comandadas pelo imperialismo se mostravam activas no Norte do nosso País, foram assassinados milhares de mestiços e de assimilados, porque eram mestiços ou assimilados. Perdemos assim esses milhares de homens, mulheres e crianças que, na sua quasi totalidade eram patriotas sinceros e combatentes fervorosos pela nossa causa da libertação. Somente porque os imperialistas conseguiram inculcar na mentalidade de combatentes políticamente pouco esclarecidos que todos aqueles que tinham a pele um pouco mais clara ou que saibam falar o português, ou ainda que tivessem servido na administração colonial, eram necessariamente traidores, não podiam lutar pela independência, não tinham esse direito, diziam eles. Foram as forças nacionalistas angolanas quem sofreu com isso, perdendo vidas preciosas, quadros importantes para a revolução e para a vida futura do País. Foram vitimas que e somaram às vítimas feitas pelos próprios colonialistas. Mas os germes que provocam o desvio da nossa linha de actuação política não são só originados pelo imperialismo. Eles provêm também de nós mesmos e por isso temos de combater também as nossas fraquezas, as nossas insuficiências, combater tudo o que é negativo em nós, nos nossos militantes e combatentes. Por vezes o que origina o ódio é a ambição à base da cor da pele, o desejo de ocupar postos elevados, o desejo de subir. O desejo de guardar para si um bom lugar no futuro. E do preconceito racial ao tribalismo apenas vai um passo. Dentro da nossa organização, o MPLA, nós combatemos com severidade tais defeitos. Os ambiciosos, os presunçosos, os que provocam distúrbios e calúnias para ocupar postos que muitas vezes não merecem ou que nem são capazes de exercer devidamente, são desmascarados perante os militantes e perante o povo inteiro. É combatendo também nesta frente de luta, na formação ideológica dos homens, na educação política dos militantes, que nós poderemos garantir para o nosso futuro uma vida verdadeiramente livre. Temos de encarar pois para os nossos partidos a linha política que nos possa salvar do racismo e do trabalhismo e dos erros que foram cometidos nos países onde a independência chegou mais cedo e por outros meios. Felizmente a acção armada, para aqueles que lutam ao lado da justiça e contra a tirania, para aqueles que desejam a liberdade, não é só um sacrifício: é sobretudo uma força. Não é só um sorvedoiro de vidas. Não é só regar os terrenos de combate com o sangue dos melhores filhos dos nossos povos. É também a escola, é também um meio para que o povo continue esta luta no futuro, após a independência política, a fim de ser completamente livre, política, económica e socialmente independente. Como anteriormente disse, a experiência africana já nos ensinou muitas coisas. De entre elas podemos citar mais uma e essa é que os partidos em todos os momentos, devem controlar a vida do País. A força que nos dão as armas com as quais nos defendemos dos ocupantes estrangeiros, com essas mesmas armas poderemos garantir no futuro a independência verdadeira. E é preciso que o Partido se estrutura, que ele tenha uma ideologia cada vez mais bem definida. Que ele constitua a espinha dorsal, a base, o elemento principal da vida da Nação. Que ele seja independente. Onde não há partido, onde os militantes não estão sujeitos a uma disciplina rigorosa, os dirigentes não se cingem aos princípios revolucionários, aí entra a anarquia. Penetram aí facilmente os inimigos e em vez de independência teremos neocolonialismo ou um jogo duvidoso entre a dependência e a independência, entre o progresso e a reacção. Ora é isto que nós não desejamos. Nós queremos uma independência completa. No início desta mensagem falei da união existente entre as organizações dirigentes da luta armada nos países dominados por Portugal, ou seja, entre a FRELIMO, o PAIGC e o MPLA, ou ainda entre os povos de Moçambique, de Guiné e de Angola. Esta união é justa e é necessária. As formas de cooperação na luta devem ser aperfeiçoadas, porque os nossos inimigos também coordenam as suas actividades. Ninguém ignora que os países da OTAN estão dando um auxílio muito importante para ajudar Portugal a continuar a sua guerra injusta. Ninguém ignora que a luta de Angola, em Moçambique e na Guiné teria já acabado vitoriosamente para os nossos povos respectivos se não fossem as ajudas matérias e em todos os outros domínios, dadas a Portugal pelos imperialistas reunidos no Pacto do Atlântico Norte. São os Estados Unidos da América, a Alemanha Federal, a França, a Grã-Bretanha e outros países quem sustenta Portugal. Mas mais um perigo se está a esboçar e em certos capítulos já tomou formas concretas: esse perigo é a intervenção do regime racista da África do Sul, odiado por todos os africanos honestos,em virtude da violência com que oprime os povos não brancos daquele país. A aliança entre estes reaccionários e o governo fascista português ou com os sul-rodesisanos, oferece um perigo bem grande para os povos de Angola e de Moçambique. Na África do Sul fala-se abertamente, nos jornais e na rádio, de intervenção directa em Angola e em Moçambique, contra os nossos povos. Evidentemente, se essa agressão se vier a verificar, os racistas sul-africanos saberão,pela sua própria experiência, aquilo que os portugueses já conhecem. Eles terão muitos cadáveres a enterrar, eles terão muitas famílias enlutadas, como as há em Portugal, eles terão muitas viaturas destruídas e aviões abatidos, e no fim, conhecerão a vergonha da derrota, pois a vitória nesta luta só pode pertencer aos nossos povos. Essa será a vitória dos nossos povos e de todo o mundo, contra a vergonha do colonialismo. É isto o que os pretenciosos racistas sul-africanos aprenderão, apesar de todo o seu potencial bélico e técnico. Uma das armas mais adequadas para podermos afastar esse perigo é exactamente consolidar a nossa união, alargá-la a outros povos que também sofrem da mesma opressão, Mas esta união deve estar liberta completamente de influências estrangeiras. Totalmente liberta. Agora, dirigir-me-ei especialmente aos meus compatriotas angolanos e aos camaradas do nosso Movimento, o nosso querido MPLA, aos combatentes que, em diversas frentes estão dando as melhores provas de coragem, espírito de sacrifício e de dedicação nesta luta dura, cheia de incidentes, alguns desesperantes mas, na sua maioria, cheios de motivos de alegria. É nítido o progresso que tem sido feito pelos nossos guerrilheiros no sentido de realizar na prática a palavra de ordem de generalizar a luta em todo o território nacional. O próprio inimigo, pela voz dos mais elevados representantes, não esconde a preocupação pelo avanço da nossa luta. Quando os colonialistas portugueses dizem que a guerrilha não atingirá o centro do País, isto significa que já lá se encontra e os que desejam enganar o povo português, fazendo-o ignorar a verdade, apenas caiem no ridículo, porque os portugueses sabem que a guerrilha está instalada no centro do país e que, dentro em breve, atingirá os centros urbanos onde, por enquanto, ainda não existem acções de carácter militar. Nós garantimos aos dignos representantes da administração colonial que dentro em breve conhecerão, mais dura e mais extensamente, os resultados da acção da nossa força armada. E não será apenas o Centro, mas também o Sul e o Norte que conhecerão um novo período de luta. Haverá mais dificuldades, mais sangue para os miseráveis colonialistas. Não é difícil desmascarar os mentirosos do governo colonial de Angola, que pretendem tapar os olhos aos colonos e à opinião pública mundial. Por um lado dizem que a guerrilha não pode avançar e, por outro lado, nos distritos onde há luta armada, todos os habitantes angolanos estão obrigados ao controlo por intermédio de certificados de residência. Estes certificados são obrigatórios, tanto no Moxico como no Bié, tanto no Uíge como em Malanje e não tardarão os decretos e portarias tornando-os obrigatórios na Huíla ou em Moçâmedes, no Cuanza Sul ou no Huambo. A luta generalizar-se-á. Se por um lado nos dizem que as forças armadas estão moralizadas, por outro lado discute-se em público se os grandes comerciantes devem dar só os anéis ou se devem também sacrificar os seus dedos para manter os seus bens, adentro do regime colonial. Os militares estão em oposição contra os civis, pois enquanto eles oferecem as suas vidas preciosas, os grandes da roubalheira e da exploração tratam de acumular bens, de viver no fasto e na despreocupação, em intoxicar-se na lama do prazer barato (ou por vezes caro), para esquecer a miséria da guerra colonial. O soldado português não é mais que um mercenário para proteger a riqueza dos senhores que o exploram. Se, por um lado, se diz que nada se passa em Angola, que há paz, por outro lado obrigam-se as populações angolanas a viver em acampamentos junto dos quartéis, com medo que elas adiram à guerrilha. Não existe qualquer espécie de confiança entre a população portuguesa e a angolana. E, mesmo assim, são centenas de homens que abandonam estes acampamentos para virem para as florestas onde, sob a direcção do MPLA, por agora se faz vida livre. O desespero dos colonialistas será ainda maior dentro em breve, pois os meios técnicos do MPLA tornam-se mais volumosos e mais perfeitos. A organização é cada vez mais larga. Os homens cada vez são mais esclarecidos nas tácticas da guerrilha e têm mais experiência política. Mas o moral da tropa portuguesa pode ser ilustrado pelo choro desesperado daquele pobre soldado, talvez filho dum camponês ou de um operário que, durante o ataque pelas nossas forças ao quartel de Karipande, abandonou chorando o seu abrigo. Que pena! É assim que se exprime quase sempre a coragem e a convicção com que o soldado português luta em Angola. A todos eles, aos covardes e aos fanáticos, nós dizemos: só há meio para acabar com esta vergonhosa situação, e esse meio é o de reconhecer o direito do nosso povo à independência, abandonar a repressão e estabelecer relações justas entre os nossos povos - o povo angolano e o povo português. OS colonialistas portugueses e os seus aliados têm espalhado pelos quatro cantos da terra o boato que a luta em Cabinda está paralisada porque os dólares americanos fizeram o seu efeito sobre o MPLA. Nós queremos deixar bem claro que nesta luta quem se vende não é o MPLA nem o povo angolano; quem se vende, quem tem hipotecadas as suas colónias e até o seu próprio país são os miseráveis governantes portugueses. São os fascistas portugueses que estão concedendo cada vez mais facilidades aos investimentos estrangeiros, em desvantagem para o povo português (este povo português de gloriosas tradições), que nada lucra com o negócio. Quem explora o ferro em Angola? Os alemães. Quem explora o petróleo? Os americanos, os belgas. A quem pertence o Caminho de Ferro de Benguela? Aos ingleses. A quem pertence a Companhia de Diamantes? Aos americanos, aos franceses, aos belgas, aos ingleses. Quem explora o petróleo no distrito de Cabinda? Os americanos. E dentro da própria metrópole, o povo português, além das formas camufladas de exploração, sabe muito bem que existem partes do território português que não estão sob o seu controlo, que estão hipotecadas, onde o povo português não manda mas obedece ao dólar. É nos Açores, é em Beja, é numa boa parte da indústria turística, etc. Quem é que se está vendendo aos estrangeiros, para continuar com a sua vergonhosa política? São somente os fascistas portuguesas. O MPLA, os seus dirigentes, o povo angolano que combate com toda a honra, de armas na mão, não se vende. Não aceita nada em troca da independência. A Vitória ou Morte! A Vitória é certa! Se o ritmo da nossa luta afrouxou nos últimos tempos em Cabinda, isso não é devido a qualquer espécie de compromisso assumido pelo MPLA. Isso deve-se, por um lado, à necessidade de generalizar a luta, portanto de enviar para outras regiões dirigentes, quadros políticos militares que, durante um certo tempo funcionaram exclusivamente em Cabinda. Deve-se, por outro lado, à acção dos contra-revolucionários. O chamado “governo revolucionário angolano no exílio”, de Kinshasa, forneceu um bom quadro ao inimigo, quando lhe enviou o Alexandre Taty que, utilizando os argumentos tribalistas, se colocou ao serviço dos portugueses. Do memso modo que se não fora a contra-revolução no Norte, o inimigo português teria já sentido os efeitos da guerrilha, não somente em Calomboloca e em Caxito, mas nas ruas de Luanda. Mas agora, felizmente, a contra-revolução está agonizante. Os colaboracionistas e os seus patrões colonialistas serão esmagados conjuntamente. Existem hoje áreas controladas pelo MPLA dentro do nosso país. Numa dessas áreas está estabelecida a Direcção do nosso Movimento. Repito neste momento, o apelo a todos os nacionalistas angolanos refugiados nos países vizinhos como o Congo Kinshasa, o Congo Brazzaville, a Zâmbia, o Botswana, o Sudoeste africano, que regressem às áreas controladas pelo MPLA, para aí darem a sua contribuição à luta. Para combater o inimigo. Para repovoar o território. Os angolanos devem voltar para Angola, para as áreas controladas pelo MPLA e aí viverem a verdadeira vida livre, dentro da dureza da luta. Os estudantes, os homens formados nas universidades e nas escolas técnicas, devem regressar ao País e aí darem a sua contribuição na luta. Entre os estudantes é necessário combater seriamente a argumentação oportunista que alguns utilizam para esconder o seu desejo de não participar na luta, de se furtarem ao perigo, ao trabalho junto do povo, para viverem a bela vida de bolseiro no estrangeiro, à custa do prestígio conquistado pelos combatentes do nosso País. Repito o apelo a todos os homens e mulheres que se encontram no interior do nosso País para redobrarem a sua actividade, quer na clandestinidade quer nas zonas libertadas. É necessário que em nenhum ponto de Angola o colonialismo português deixe de sentir o efeito da guerra. Constituam-se os grupos e os comités de acção onde ainda não existem e actuem ordenadamente, destruindo a economia, destruindo os meios que possui o inimigo para fazer a guerra e continuar a exploração. A nossa contribuição deve ser dada não apenas tendo em vista a liquidação do sistema colonial, mas também para liquidar a ignorância, a doença, as formas primitivas de organização social. É nas escolas, para uma alfabetização intensa, é nos dispensários médicos, nos Centros de Instrução Revolucionária, na produção agrícola e industrial, como no comércio, que cada angolano, de baixo das bombas que por vezes caiem sobre as florestas deve dar a sua contribuição. Todos os angolanos, sinceramente patriotas, devem regressar agora para o interior do País. Devemos ser activos. As organizações de massas, os sindicatos, os organismos de jovens, de mulheres e outros, estão já fazendo a sua primeira experiência dentro do País. As instituições de assistência médica, de educação, de trocas comerciais e de cooperação no trabalho estão fazendo a sua aparição nas zonas livres. É portanto AGORA que todos os angolanos devem abandonar o estrangeiro para regressar ao País e aí trabalhar para a vitória da Revolução. Não falarei dos que necessariamente tombam durante a luta. A estes temos de render a nossa sincera e singela homenagem. A libertação da Pátria necessita de sangue, em primeiro lugar do sangue do sues melhores filhos. Não choremos pois os mortos. Tomaremos o exemplo do seu heroísmo, do seu valor, para avançarmos o mais possível e o mais rapidamente possível, e assim tornamos o seu heroísmo útil para o nosso povo. Continuemos a acção. Saibamos aproveitar todos os elementos ao nosso dispor para atirarmos ao mar os colonialistas lusitanos. Camaradas, A Vitória é Certa! (Documento do MPLA, em port.)
Discurso de Agostinho Neto (transmitido no Angola Combatente na Tanzânia) corrigido
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