Editorial para Voz de Angola Combatente, sobre assassinato de Che Guevara

Cota
0106.000.036
Tipologia
Texto de Análise
Impressão
Dactilografado (2a via)
Suporte
Papel Comum
Autor
MPLA «Angola Combatente»
Data
Idioma
Conservação
Razoável
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4
VOZ DE ANGOLA COMBATENTE PROGRAMA DO DIA 9 DE OUTUBRO DE 1968 EDITORIAL O assassinato do comandante Ernesto Che Guevara em 8 de outubro de 1967 por mercenários bolivianos ao serviço do imperialismo, foi sentido com intensa emoção pelos povos revolucionários de todo o mundo e em particular na América Latina na Ásia e em África. De nada serviu aos seus assassinos o terem ocultado o próprio lugar onde foi sepultado o Heroico comandante. O seu exemplo revolucionário ganhou o coração de todos os oprimidos em luta, encorajando a formação de novos núcleos de combatentes em toda a parte onde campeia a exploração e a opressão imperialistas. Mesmo aqueles que dentro do processo revolucionário mundial manifestavam discordâncias com algumas das teses de Che Guevara, não hesitaram em reconhecer que a Humanidade perdeu um Homem de uma rara estatura moral, um internacionalista militante, que consagrou a sua vida à luta pelo triunfo dos nobres ideais do mundo oprimido. Nascido na Argentina, filho de um agricultor de Buenos Aires, médico de profissão, Ernesto Che Guevara não se acomodou ao conforto que lhe prometia o exercício da medicina para se dedicar inteiramente ao combate contra a dominação imperialista do continente latino-americano que ele considerava no seu todo como a sua pátria. É assim que em 1956 conhece no México Raul de Castro, que o apresentou em seguida a seu irmão Fidel de Castro, na época em que um punhado de cubanos se preparava para derrubar a ditadura de Baptista. Guevara junta-se ao grupo rebelde e embarca com ele no celebre iate «Granma» que conduziu o grupo até à costa de Cuba. Che Guevara tomou parte nos primeiros combates contra as forças de Baptista e logo foi elevado à patente de Comandante pelo valor que desde logo demonstrou. No início de 1958, no cumprimento de um audacioso plano das forças rebeldes, é Guevara quem dirige a invasão da província cubana de LAS VILLAS e refugiando-se na Serra de Escambray dai coordena a acção dos diversos grupos sob o seu comando. E nessa altura que à frente de 300 homens, lança um ataque a SANTA CLARA pondo em debandada milhares de soldados fantoches com todos os seus tanques e todas a artilharia, ataque este que foi decisivo para a derrota do tirano. Após o triunfo da Revolução o heroico comandante que tinha sido adoptado pelo povo cubano, desempenhou as mais diversas funções de alta responsabilidade. Foi ministro da Indústria que empreendeu uma longa viagem pelos vários países do chamado Terceiro Mundo, tendo tido nessa altura oportunidade para contactar em Brazzaville com alguns dirigentes e militantes do MPLA. E ainda nessa altura que Che Guevara participa na Conferência Económica afro-asiática de Alger onde se concretiza a ideia de fundar a Organização de Solidariedade dos povos de Asia, África, e América Latina que viria a nascer um ano depois em Habana. Regressado a Cuba não tardou que desaparecesse misteriosamente, dando ensejo a que imperialismo formulasse as mais abjectas hipóteses. Uma carta sua a FIDEL DE CASTRO largamente difundida pelo governo de Cuba, trouxe a luz sobre o seu desaparecimento, motivado, como escrevia, pelo facto de outras terras reclamarem o concurso dos seus “modestos esforços”. Durante muito tempo se ignorou o verdadeiro paradeiro de Che Guevara, até que o desenvolvimento da guerrilha na Bolívia começou a fazer admitir a sua presença ao lado dos guerrilheiros bolivianos. Sobretudo após a prisão do escritor francês Regis Debray – que tinha passado algum tempo no maquis da Bolívia - a hipótese da presença de Che Guevara nessa Região começou a tornar-se certeza. Como o seu DIÁRIO havia de revelar mais tarde, a guerrilha boliviana vivia nesse momento a fase decisiva da sua implantação no seio das massas camponesas. Centenas de mercenários bolivianos treinados e dirigidos por peritos americanos de contra-guerrilha, conseguiram isolar Che Guevara e os seus valorosos companheiros que conseguiram durante muito tempo resistir ao cerco. No entanto o heroico comandante, que se encontrava desde há muito inferiorizado por uma asma crónica para a qual se lhe acabaram os medicamentos, tendo sido gravemente ferido durante os combates, veio a cair prisioneiro das forças fantoches que o assassinaram cobardemente.“” Às valiosas qualidades de combatente Che Guevara aliava a qualidade de escritor sobretudo preocupado em divulgar as suas experiências e as suas concepções revolucionárias. A sua militância internacionalista fazia-o sentir e exaltar a gloriosa luta do povo do Vietnam e a dos povos das colónias portuguesas, da África do Sul e da Rodésia, sem deixar de denunciar e condenar a agressão imperialista contra o Laos, contra a Coreia ou contra o Camboja. Nos seus escritos e nos seus discursos era implacável contra todos os opressores. No seu cérebro e no seu coração não havia lugar para o egoísmo e para o nacionalismo estreito, sentindo-se fraternalmente ligado a todos os oprimidos do mundo por quem se mostrou sempre disposto a verter o seu sangue. Numa mensagem histórica à Tricontinental pronunciou-se pela “guerra total à opressão”: “Há que levar a guerra – disse – até onde os inimigos a levem: às suas casas, aos lugares onde se divertem: há que impedi-los de gozar mesmo de um minuto de tranquilidade ou um minuto de sossego fora dos seus quartéis; há que criar-lhes por toda a parte a sensação de feras acossadas”. De Che Guevara é também esta profissão de fé: “EM QUALQUER LUGAR ONDE A MORTE NOS SURPREENDA, BENVINDA SEJA, SEMPRE QUE O NOSSO GRITO DE GUERRA SEJA OUVIDO, QUE OUTRA MÃO SE ESTENDA PARA EMPUNHAR AS NOSSAS ARMAS E QUE OS OUTROS HOMENS SE APRONTEM PARA ENTOAR OS CANTICOS FUNEBRES COM O MATRAQUEAR DAS METRALHADORAS E COM NOVOS GRITOS DE GUERRA! No Paraguai como nos bairros negros da América, no Yémen como no Laos, em todos os continentes, esta mensagem de Che Guevara foi entendida, e por cada combatente que tomba logo outro, logo outros surgem para empunhar a sua arma e o processo não cessará até que triunfe a justa causa por que tombou o HEROICO GUERRILHEIRO; TAM TAM TAM TAM Nos primeiros dias de Janeiro de 1965 o Comandante Ernesto Che Guevara, então ministro da Industria do Governo de Cuba, de passagem por Brazzaville, não deixou de visitar uma dependência do MPLA, onde o acolheram alguns dirigentes e militantes do nosso Movimento, entre os quais o nosso Presidente. Depois de uma afectuosa troca de comprimentos o ilustre visitante foi convidado a dizer algumas palavras aos militantes do MPLA. Eis alguns ecos sonoros desses momentos significativos: BANDA SONORA EM ESPANHOL ATÉ «GUINÉ DITA PORTUGUESA» sobrepondo-se a leitura da tradução em português. “Eu tenho muito prazer em estar aqui convosco e em ver na prática como se está estruturando e desenvolvendo a vossa luta armada dirigida contra o colonialismo português e simplesmente vou dizer-vos que já tenho dito um número suficiente de vezes: Que Cuba está inteiramente convosco, com todo o Povo angolano, assim como os povos de Moçambique e da Guiné dita Portuguesa. O nosso princípio é o de apoiar todos os povos que lutam para se libertarem do colonialismo e naturalmente gostaria de dizer-nos duas ou três coisas da nossa experiência que não foi muito grande, mas que foi muito rica. Cuba é um país que tem apenas cento e catorze mil quilómetros quadrados, um pedacito de Angola; um país plano. Os montes foram desfeitos a muitos anos pelos colonizadores espanhóis, de maneira que praticamente não havia lugares onde lutar, salvo na Sierra Maestra. É uma serra desértica; Forma uma cadeia que tem uns 800 kilómetros de comprimento mas que tem de largo apenas 20 kilómetros. E foi nesse cenário que se realizou a luta. As vezes lançavam directamente contra nós dez mil homens e nós só tínhamos nesse momento duzentas armas. Contávamos somente as armas e não os homens, porque um homem sem arma não tem sentido na organização da defesa. No entanto nós causávamos-lhe muitas baixas porque tínhamos uma experiência grande: sabíamos aproveitar o terreno e havia a superioridade moral dos nossos guerrilheiros sobre o exército de Baptista, - o exercício opressor. E isso é algo fundamental. Se me permitem dizer-lhes, sem qualquer pedantismo e apenas com experiência que tenho posto ao serviço de uma causa tão nobre como a nossa: o problema mais difícil é transformar o homem que está na montanha num guerrilheiro – e esse é um problema fundamental. Guerrilheiro não é aquele que está na montanha ou em qualquer outra zona de combate; guerrilheiro é o homem que já aprendeu a adaptar-se ao meio, a tirar desse meio tudo que ele pode dar a seu favor e que perdeu o medo do exército inimigo. Isto é uma questão que não se consegue de um dia para o outro e ninguém nasce herói, nem a heroicidade é algo que se semeie. A Heroicidade é uma parte do trabalho ideológico, do trabalho de endoutrinamento constante e do exemplo dos dirigentes; dessa forma consegue-se formar um exército que pode derrotar o exército opressor. Nós a princípio fugimos. Vinham os aviões, fugíamos, vinham os tanques fugíamos e fugíamos diante dos próprios soldados. Não éramos um exército de heróis, longe disso. Mas no final, um grupo nosso, relativamente pequeno, derrotou já totalmente o exército da tirania. Destroçou-o em batalhas campais, tomou-lhes as cidades e obrigou-o a capitular. Mas todo esse processo foram dois anos de luta, de fracassos, de recomeços, de privações, com uma fé na vitória e o desejo constante de transformar o homem da montanha na espinha dorsal de todo o movimento. Ao homem da montanha há que dar maior atenção pois ele será o elemento decisivo na luta. Sem esquecer que será depois necessário prever as situações que se apresentarão no campo da saúde pública e noutros sectores, prever os quadros necessários para todas essas coisas. Mas neste momento a guerrilha é a chave da vitória. Se não se lhe dá atenção, se não se lhe mandam os melhores quadros, se não houver uma consciência clara de qual deve ser a estratégia, ou de qual deve ser a táctica guerrilheira a seguir, utilizando o combate como a escola fundamental da guerrilha, então a vitória será… pelo menos…mais lenta. Esta é pelo menos a nossa experiência. Já vos disse que não foi muito grande, pois foram dois anos, nada mais; mas foi bastante rica. Agora temo-la enriquecido mais em contacto com outros países que fizeram também a sua própria revolução. E todos estamos de acordo nas questões fundamentais. Pode ser que sirva para vós outros… Final em espanhol… Tais foram as palavras que o Heroico Guerrilheiro dedicou aos militantes do MPLA justamente no período em que se esboçava dentro das nossas fileiras o processo da consolidação da luta armada. Do sangue de Che Guevara, do sangue dos heróis angolanos que tombaram um novo mundo ressurgirá de onde estarão banidas para sempre a opressão e a exploração do homem pelo homem. Homenageando Che Guevara no primeiro aniversário da sua morte, ANGOLA COMBATENTE presta homenagem a todos os guerrilheiros que em Angola, no Vietnam, na Guiné, em Moçambique, nas Américas e na Rodésia estão tombando pelos ideais sagrados de Liberdade e de Justiça!
Editorial para Voz de Angola Combatente, sobre assassinato de Che Guevara
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