Carta de Spiele Maurice Philippe a Agostinho Neto e Lúcio Lara

Cota
0055.000.023
Tipologia
Correspondência
Impressão
Dactilografado
Suporte
Papel comum
Remetente
Spiele Tendele Maurício Filipe
Destinatário
Agostinho Neto- Presidente do MPLA e Lúcio Lara - MPLA - DOQ
Data
Idioma
Conservação
Bom
Imagens
3
Observações

Foi publicado no 3º volume de «Um amplo movimento…»


SPIELE Maurice Philippe
C.P. 25 Moanda, 1 de Outubro de 1963
MOANDA
CARTA PRIVADA
Aos Camaradas:
– Agostinho Neto, Presidente CD MPLA
– Lúcio Lara, Chefe Org. & Quadros MPLA.
Camaradas,
Antes de mais, tenho o prazer de enviar os meus votos sinceros de que esta carta vos encontre de perfeita saúde natural e que sejam progressivos os esforços que desenvolvem pela causa do MPLA e do Povo Angolano.
O conteúdo da presente carta é a expressão profunda e a simpatia dos meus sinceros e respeitosos sentimentos para este dia, ou seja uma reacção provavelmente moral que me liga à causa do nosso Movimento.
Primo, numa carta da Camarada Deolinda ao Camarada Sunda Paulo, acabei de saber do abandono do Movimento por certos camaradas de luta tais como os Drs. Boavida, Lopes, Boal, etc... e com efeito pergunto-me com certa surpresa, que condições verdadeiras teriam impelido os ditos camaradas a tomar uma tal decisão inevitável por parte deles. Isso leva-me a infinitos pensamentos sobre o destino exacto que o nosso Movimento está a sofrer actualmente.
No entanto, antes que eu desespere do que quer que seja, gostaria de ser, que nós fôssemos, informados oficialmente por vós, e isso para evitar qualquer mal-entendido.
Assim tenho de vos dizer muito simplesmente que, se cada um de nós deste Movimento se vir na obrigação de abandonar o Movimento, seria então útil avisar-nos para não continuarmos a depositar as nossas esperanças num MPLA que não tem militantes dirigentes (Superiores) com uma consciência absolutamente grandiosa em defender o interesse do Movimento e de todos os seus militantes; enquanto que nós aqui, membros de acção, apesar da crise que atravessa o Movimento, tentamos sempre defender, trabalhar para a salvaguarda dos interesses particulares dos dirigentes (Superiores) e dos gerais do Movimento Popular.
Enfim, penso convictamente que, com a vossa maturidade individual, se esforçarão para encontrar uma solução pacífica que possa trazer de volta tais camaradas para uma reconciliação perfeita de forma a evitar o mais cedo possível a gravidade da derrota da nossa política sob todos os pontos de vista, sobretudo perante o Povo Angolano que possui ainda a nossa confiança.
Secundo, de nossa parte, no que diz respeito ao movimento popular, limito-me em informar-vos que aqui a situação mantém o seu ritmo, quer dizer, todo o mundo está aqui, os olhos fixos, parecendo alguém que, com esperança, espera um feliz acontecimento para lhe apaziguar o espírito. Enquanto uns tentam resistir à crise gritante que o nosso Movimento atravessa, os outros questionam-se sobre a envergadura exacta visada actualmente pela linha política do MPLA, visto que todas as actividades do movimento abrandaram.
Já não há mais voz, quero dizer, já não há comunicados, nem declarações, nem informação.
Nem o MPLA, por um lado, nem a FDLA, por outro, nos fornecem qualquer notícia de carácter político respeitante à luta. Em relação a isso, do nosso lado, a mobilização das massas está-se a tornar muito custosa. No quadro da formação dos militares e dos quadros, já nenhuma actividade chama a atenção das populações. Actividades que podem ainda incitar estas últimas a guardar ou a reforçar a consciência do Movimento. O que leva a conceber, a pensar que o Movimento do Povo está paralisado sem esperança de resistência. Portanto, cabe-vos tomar medidas adequadas com vista a recriar, retomar o equilíbrio político do Movimento a partir de alguns pontos que, para a Costa são:
1 – Reorganização imediata do EPLA.
2 – Retoma imediata da luta armada.
3 – Engajamento urgente da Juventude para reforçar o EPLA.
4 – Reorganização da equipa “Propaganda e Agitação”.
5 – Reforçar essa propaganda com base em informação, declarações, comunicados, etc...
6 – Revisão e realização da questão das Bolsas de estudo.
7 – Questão do CVAAR – (distribuição contínua de vestuário, alimentos e medicamentos).
8 – Procurar por todos os meios possíveis levantar e melhorar, como no passado, a atmosfera política do Movimento e da sua luta política e militar.
9 – Apelar a todos os militantes excluídos e do Bloco Viriato, assim como aos que desertaram para assistirem à II Conferência Nacional e encontrar resoluções em pé de igualdade com vista a uma reconciliação perfeita. Fazer o melhor possível para que os militantes como Mário de Andrade, Manuel Lima, Boavida, Boal, Lopes, etc... possam retomar as suas actividades no Movimento.
10 – Continuar os contactos de solidariedade política com os países Afro-Asiáticos socialistas, mesmo com os países da Europa, com vista a reforçar a linha ­política do nosso Movimento.
Tercio, de acordo com a promessa que me tinham feito aquando da minha mais recente estadia em Léopoldville e na sequência da exposição das minhas dificuldades particulares, promessa segundo a qual eu deveria, como os meus amigos estudantes da Região Costeira de Moanda, ir para o estrangeiro com Bolsa de estudo, faço questão de vos informar que:
a) acabo de vender todos os meus bens e actualmente estou, como o resto dos camaradas, disposto a qualquer eventualidade de partida para o estrangeiro.
b) chego aí imediatamente antes do quinze deste mês caso não me seja dirigido nenhum telegrama vindo de vossa parte a este propósito.
c) Assim que saiba, como tenho esperança, que a nossa partida para o estrangeiro está realmente fixada, vamos com o Camarada Paulo e o resto, reorganizar o Comité de Acção cuja composição vos será ­comunicada posteriormente.
Para terminar, queiram aceitar, Caros Camaradas, a expressão dos meus sentimentos mais sinceros e respeitosos e os meus votos de prosperidade e de felicidade nas vossas ocupações actuais.
O vosso Camarada:
SPIELE M. Philippe
Secretário Político
Comité de Acção MPLA – Moanda

Carta de Spiele Maurice Philippe (Moanda) a Agostinho Neto e Lúcio Lara

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